O Congresso Internacional de Justiça de Transição, ocorrido na semana passada na Faculdade de Direito da UFMG, entre os dias 23 e 25 de maio, apresentou 4 painéis, no sentido dos resgates e suas consequências necessários de serem promovidos ou acentuados no país: O direito à memória e à verdade e identidade constitucional, Políticas de reparação, Constitucionalização e responsabilização criminal e civil na América Latina e, finalizando, Reformas institucionais e consolidação do Estado Democrático de Direito. No sábado dia 25 foi inaugurado monumento no canteiro central da avenida Afonso Pena em Belo Horizonte, em frente ao antigo prédio do DOPS, contendo nomes de militantes mortos durante o regime militar, e promovida manifestação para se transformar o prédio em um centro de memória das vítimas da ditadura.
A memória autoritária brasileira, cuja última manifestação mais prolongada foi a ainda recente ditadura militar, ou burocrático-autoritária, exige para sua superação e efetiva democratização do país que se acentuem os debates sobre a transição do autoritarismo para a democracia. Isso diz respeito tanto aos aspectos pertinentes à atuação da Comissão da Verdade e aos levantamentos produzidos pelas Caravanas da Anistia quanto aos debates e ações promovidas institucionalmente ou não - e que devem ser ampliados pelo movimento social para real êxito - em relação às praticas autoritárias vivenciadas cotidianamente, nas diversas instâncias da vida nacional. E esse processo implica inclusive em discutir profundamente e mobilizar a sociedade por uma maior democratização da mídia nacional e dos sistemas de Comunicação no país.
Em maio do ano passado, durante o Congresso de Justiça de Transição e 120 anos da Faculdade de Direito da UFMG, entrevistamos o secretário nacional de Justiça, Paulo Abrão, mas a matéria não foi publicada à época. Publicamos agora, abaixo, acrescida de uma nova pergunta (a última, na entrevista abaixo), acompanhada de fotos dos eventos da semana passada. Manifesto distribuído nas ocasiões recentes pela Frente Independente pela Memória, Verdade e Justiça-MG, que tem discordâncias em relação à atuação da Comissão Nacional da Verdade, estão aqui também publicados. Tudo ao fogo que tudo purifica. Acesse AQUI a página da Comissão Nacional, e AQUI a do Congresso Internacional de Justiça de Transição.
Foto extraída do site da OAB-MG |
Paulo Abrão - A Comissão é um instrumento privilegiado para se superar a cultura da violência, do autoritarismo e se afirmar as liberdades de pensamento, as possibilidades de organização da sociedade. Mas a sua instituição por si só já é uma ruptura com o medo de um tema que é interditado até hoje. Ela já simboliza certamente um movimento da sociedade civil para com sua história.
Blog - Dá para se perceber o reflexo do movimento pela implantação da Comissão no comportamento ou na compreensão da sociedade civil , em função da existência dessa memória autoritária, que ainda é muito presente nas famílias, nas instituições...
Paulo Abrão - A Comissão começou seus trabalhos agora, né, e terá dois anos pela frente. Ainda não sabemos como serão organizados, qual será a metodologia a ser utilizada, mas estamos muito otimistas de que ela simbolize essa nova perspectiva de reconhecimento de nossa identidade nacional como um povo que sabe resistir contra a opressão.
Blog - A mídia é um fator fundamental para deslanchar essa perspectiva anunciada pela Comissão...
Paulo Abrão - A sociedade tem que saber usar seus direitos constitucionais. Um deles é o de se organizar livremente pelas redes sociais, pelos blogs, pela mídia alternativa, pelos jornais de comunidade e fazer valer uma voz que seja legítima das bases, e por vezes confrontar interesses econômicos maiores. Ao mesmo tempo temos que ter muito bem clara a proteção à liberdade de imprensa como algo que é muito caro e que deve estar acima de toda e qualquer possibilidade de restrição a ela.
Blog - O neo-liberalismo também comportou uma força muito grande na mídia, um certo fascismo, que podemos perceber mesmo através de assassinatos de reputação que são cometidos, no Brasil, no mundo... Numa época em que estão propostos certos resgates no país e percebe-se o desejo e a necessidade de uma transição para uma relação mais humanista entre as pessoas, outro modelo de convivência, como você vê essa questão dos assassinatos de reputação? (CLIQUE AQUI para ler sobre um caso notório, entre outros, motivado também por questões políticas)
Paulo Abrão - Penso que depois que o Supremo declarou inconstitucional a lei de imprensa fundamentalmente precisamos criar algo que substitua o vácuo que gerou em torno da extinção do direito de resposta, imediato, num tempo célere, que possa proteger a verdade dos fatos e a pluralidade de visões em torno dos episódios que permita às pessoas se defenderem igualmente de eventuais maus usos dos meios de comunicação, o que é inadmissível na nossa democracia.
PS EM 13 DE JUNHO - Ministério Público Federal pede tombamento da antiga sede do DOPS em BH. LEIA AQUI